Com demora, processo pula uma etapa
Tema depende de decisão do Congresso
Desmatamento zero é difícil, diz ministro
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, 43 anos, quer acelerar o licenciamento ambiental para obras. Ele considera o processo muito demorado e pouco transparente.
Por isso, quer estabelecer a passagem automática para a etapa seguinte de processos que ficarem muito tempo parados. “Algumas instâncias podem ter o decurso de prazo”, disse em entrevista no estúdio do Poder360. O tema será discutido pelo Congresso.
Assista à íntegra (28min39s):
A escolha de 4 oficiais da Polícia Militar Ambiental de São Paulo como diretores do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Biodiversidade), adiantada ontem pelo Poder360, trará vantagens à gestão, na avaliação dele. “É 1 corpo coeso”, afirmou.
Salles vê dificuldades para ter o desmatamento ilegal zero como meta devido aos conflitos em áreas próximas às unidades de demarcação. Defende fiscalização rigorosa. E ressalva que a eliminação de áreas verdes seguindo a lei deve ser respeitada.
Eis uma galeria de imagens registradas pelo repórter fotográfico do Poder360, Sérgio Lima:
A seguir, os principais trechos da entrevista:
Poder360: O Ministério do Meio Ambiente vai lançar na próxima semana o programa Lixão Zero. Os lixões vão acabar mesmo no Brasil?
Ricardo Salles: Deveriam. Claro que isso não é uma tarefa fácil, nós temos um país continental, com mais de 5.000 municípios, muitos com problemas financeiros graves. Mas essa cultura de enterrar lixo, ou, pior, abandono do lixo no local, está muito atrás do que o processo tecnológico permite.
Hoje no mundo inteiro, você tem reaproveitamento, reciclagem, e isso culmina com uma destinação para aproveitamento energético. O que deveria ir para o aterro é só o material inerte. Então nós temos de fazer 1 esforço, o governo nacional, governos estaduais e municípios para a gente caminhar para extinguir os aterros.
Há perspectivas de o licenciamento ambiental ser mais rápido e eficiente no Brasil?
Sim. É necessário que seja. O Congresso Nacional vai discutir a Lei Geral de Licenciamento. Nós precisamos auxiliar o Legislativo para que formule o melhor marco legal. Temos uma deficiência de análise em muitos casos, em que seria preciso ter aprofundamento, e, por outro lado, 1 excesso de burocracia, perda de tempo, retrabalho, em situações em que não há grande preocupação ambiental.
É possível determinar 1 prazo para que se tome a decisão?
É possível para alguns casos. Claro que a concessão de uma licença pelo mero decurso do prazo é uma situação impossível de ser concebida na área ambiental, porque falamos de valores que são direitos indisponíveis. Você não pode tratar a licença ambiental como algo que, se não deu em certo tempo, pode autorizar. Mas você pode ter 1 mecanismo durante o processo, algumas instâncias podem ter o decurso de prazo como uma trava de liberação para aquela fase do processo.
O desmatamento vai diminuir no Brasil?
Nós temos de fazer 1 esforço para que o desmatamento ilegal seja combatido no Brasil. Há 1 sentimento correto de que o Brasil é o pulmão do mundo, com ecossistemas que precisam ser preservados, conciliando o direito de propriedade e o desenvolvimento econômico, mas pautado pela lei. Nós temos no Brasil a lei mais restritiva do mundo, o Código Florestal. Não permitir que ele alcance seu objetivo é 1 grande desserviço para o Brasil, inclusive para o meio ambiente. Produtores poderiam já estar recuperando áreas.
O desmatamento ilegal pode ser completamente eliminado?
Você dizer que todo o desmatamento ilegal deve ser eliminado, embora desejável, é pouco provável, porque o Brasil é 1 país gigantesco, com diferenças regionais inclusive na Amazônia. Há uma pressão sobre unidades de conservação, sobre terras indígenas, que vão constantemente ser fustigadas. Nossa resposta tem de ser rigor na fiscalização e na punição dos ilegais.
O que o Brasil pretende cumprir ou deixar de cumprir no Acordo de Paris?
O Brasil fez as contribuições determinadas pelo próprio país, e está caminhando muito bem para cumpri-las, seja no aumento da área reflorestada, seja na redução da emissão de gases do efeito estufa. Vamos cumprir. Nossa preocupação é que o Brasil não assuma novos compromissos sem antes fazer uma verificação de quais os recursos financeiros que o mundo prometeu e que deveriam reverter para os brasileiros que ajudam a cumprir a meta brasileira.
Nós temos 1 bom trabalho para mostrar, e o Brasil precisa ser remunerado por isso.
A preocupação do governo é que seja feita essa compensação dos países desenvolvidos para os países em desenvolvimento, inclusive o Brasil, que é o que mais faz, mais preserva, na agricultura, na pecuária. Aliás, precisamos incluir nesse trabalho o grande esforço da agenda urbana. É o grande problema do meio ambiente, não é o campo. Deixou-se isso de lado. Você vê as cidades com os rios todos poluídos. Há problemas sérios de ar e pouca vegetação urbana.
O que mudou na concessão de parques nacionais?
O setor privado desempenha essa função muito melhor. Queremos fazer mais 20 concessões até o fim do ano, em 1 modelo mais atrativo. Nas concessões feitas até agora se davam alguns serviços como potenciais para investir. Queremos inverter essa lógica, como se faz em vários países, em que cabe ao setor privado indicar todos os serviços em que querem desenvolver. O poder público verifica se há algum que prejudica o objetivo da preservação. Isso gera mais emprego, mais opções de turismo. Quem não conhece, não usufrui, não preserva.
O senhor nomeou novos diretores para o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). Pode comentar?
Nós fizemos 1 trabalho importante do começo do ano até agora com Adalberto Eberhard, que é uma pessoa a quem eu considero muito, fez um bom trabalho, e, por questões pessoais, houve por bem sair da presidência. Nós decidimos também trocar os diretores.
Virá para a presidência do ICMBio o comandante da Polícia Militar Ambiental de São Paulo, coronel Homero Cerqueira, 1 excelente policial e profissional, capacitado experiente, e que trará grande objetividade para a Presidência do ICMBio.
E também o coronel Fernando Lorencini, o tenente-coronel Marcos Simanovic, o major Marcos Aurélio Venâncio e o major Marcos José Pereira. São 4 profissionais muito competentes e que passam a integrar uma equipe que fará um excelente trabalho. É um corpo coeso e competente.
O ministério anunciou o coronel do Exército Antônio Mendes como presidente interino do ICMBio, depois voltou atrás. Por quê?
Nós entendemos que fazer uma transição em 1 curto espaço de tempo não seria bom.
Foi nomeado para uma diretoria do Ministério do Meio Ambiente o empresário André Germanos. Ele preenche os requisitos para o cargo?
O André é formado em administração pública. Tem mais de 20 anos de experiência em instituições e sabe lidar com a captação e aplicação dos recursos. Aliás, essa é uma deficiência do setor público. Não basta só o conhecimento ambiental.
O senhor se queixou em uma visita ao parque da Lagoa do Peixe (RS) que os funcionários não estavam lá, e eles argumentaram que não houve uma comunicação da sua visita. Há 1 conflito com os funcionários?
Eu tenho viajado a todas as regiões do Brasil. Para minha insatisfação, em vários lugares, sobretudo nesse, há relatos persecutórios contra pessoas que têm propriedades dentro ou próximas das áreas de conservação. Quando se cria uma área de proteção, o 1º requisito é que o Estado faça uma indenização. Alguns funcionários criam situação de embaraço para as pessoas serem obrigadas a sair. Isso é inaceitável. Fomos ao local para saber a realidade.
Desembarcamos em Mostardas. Ficamos no escritório do ICMBio. E todos nos deslocamos em seguida para a agenda em Tavares. Todos. Como a pessoa alega que sabia se estava no local? Alguns foram para o evento e alguns, não, porque não queriam ouvir dos moradores na presença do ministro, as críticas ao comportamento. Vamos estabelecer 1 relacionamento melhor com os moradores. Há relatos semelhantes em vários locais do Brasil.
A falta de pagamento das indenizações vai ser resolvida?
Alguns perímetros foram demarcados sem muito critério. Em alguns casos se colocou no mesmo perímetro da área de preservação vilas ou povoamentos. Em alguns casos se pode fazer 1 ajuste no perímetro. Há casos em que pode haver exploração artesanal. Não tem sentido restringir completamente. Nos casos em que há justificativa, é pressuposto que se faça a regularização fundiária.
Juntar ICMBio e Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis) é uma coisa que pode ser feita?
Pode ser feita. Não sei neste momento se nós vamos fazer ou não. Estamos desde o início do ano em 1 processo de melhoria de gestão em cada 1 dos órgãos. Se em determinado momento nós entendermos que o passo necessário é a unificação, nós vamos fazer. Mas não é, neste momento, nosso objetivo.
Os centros de pesquisa do ICMBio serão mantidos?
Estou visitando as unidades de conservação e também pretendo ir aos centros de pesquisa. Acho importante ter uma noção clara do que está sendo feito em cada lugar e a que custo para o contribuinte e com que resultados. Após isso a gente vai decidir em quais casos há necessidade de mudança.
A lista de peixes em extinção continuará valendo?
Nós recebemos 1 pleito do secretário da Pesca, Jorge Seif, e vamos chamar o setor produtivo e alguns especialistas –como o próprio Seif– para discutir. Tem de haver esse diálogo. Se houver justificativa, a norma será mantida. Se não, no todo ou em parte, será revista.
Sobre a condenação que o senhor teve em São Paulo, e da qual está recorrendo, pode dizer quais são seus argumentos de defesa?
Nós recebemos 1 plano de manejo absolutamente mal estruturado. Criamos 1 grupo de trabalho com quase 30 pessoas da Secretaria [de Infraestrutura e Meio Ambiente de São Paulo] e fizemos a revisão porque entendemos que era o certo. Acho isso até hoje. Encaminhamos ao Consema, o conselho de Meio Ambiente, votamos e aprovamos a matéria.
Por inconformismo, isso foi objeto de uma ação civil pública contra mim. Reconheceu-se que não obtive nenhuma vantagem e que havia problemas a serem sanados, mas que a forma como fizemos não era a que se entende ser a mais adequada, portanto ensejaria uma condenação. Eu entendo que nem essa condenação é correta.