Após cinco dias de diálogos na Quarta Assembleia da ONU para o Meio Ambiente, em Nairóbi, no Quênia, ministros de mais de 170 países adotaram na sexta-feira (15) um plano que pede a aceleração da mudança para modelos sustentáveis de desenvolvimento. Documento afirma que é necessário usar ciência e inovação para tornar o uso de recursos naturais mais eficiente, reduzir o uso de plástico descartável e promover economias de baixo carbono.
Durante o evento, líderes de governo expressaram preocupação com as crescentes evidências de que o planeta está cada vez mais poluído, cada vez mais quente e com recursos se esgotando. O documento aprovado pelos ministros aponta que a transição para sistemas produtivos sustentáveis é necessária para cumprir a Agenda 2030 da ONU — o conjunto de metas para eliminar a fome e a pobreza, diminuir desigualdades, proteger a vida terrestre e marinha e combater as mudanças climáticas ao longo dos próximos 11 anos.
“Reafirmamos que a erradicação da pobreza, transformando aquilo que é insustentável, promovendo padrões sustentáveis de consumo e produção e protegendo a gestão dos recursos naturais que são a base para o desenvolvimento social e econômico, são os objetivos fundamentais e as exigências essenciais para o desenvolvimento sustentável”, disseram os ministros em sua declaração final.
“Iremos melhorar as estratégias de gestão dos recursos naturais, integrando perspectivas que englobem o ciclo completo da vida (dos materiais e produtos) e análises que concretizem economias de baixo carbono e eficientes em relação aos seus recursos.”
Mais de 4,7 mil delegados, incluindo ministros do Meio Ambiente, cientistas, acadêmicos, líderes empresariais e representantes da sociedade civil, estiveram presentes na Assembleia — o órgão mais importante sobre meio ambiente em nível global. As decisões tomadas no encontro vão definir a agenda das nações em preparação para a Cúpula de Ação Climática da ONU, em setembro.
Os chefes das pastas ambientais dos países também se comprometeram em promover sistemas alimentares com práticas de agricultura resilientes. Outras promessas incluíram enfrentar a pobreza por meio da gestão sustentável de recursos naturais, promover o uso e compartilhamento de estatísticas ambientais e reduzir consideravelmente a utilização de plásticos descartáveis.
“Nós vamos lidar com o dano causado a nossos ecossistemas pelo uso insustentável de produtos plásticos, promovendo a redução significativa de produtos descartáveis de plástico até 2030, e iremos trabalhar com o setor privado para encontrar produtos ambientalmente amigáveis e financeiramente acessíveis”, disseram os representantes de governo.
Para enfrentar as lacunas no conhecimento científico, ministros prometeram trabalhar para produzir dados que sejam comparáveis entre os países. Dirigentes também concordaram em aprimorar sistemas e tecnologias de monitoramento dos ecossistemas. Os chefes das pastas ambientais ainda expressaram apoio aos esforços da ONU Meio Ambiente para que a agência elabore uma estratégia global sobre estatísticas até 2025.
“O mundo está numa encruzilhada, mas hoje escolhemos o caminho que iremos seguir”, disse Siim Kiisler, presidente da Assembleia e ministro do Meio Ambiente da Estônia.
“Decidimos fazer as coisas de outro modo. Desde reduzir nossa dependência dos plásticos descartáveis a colocar a sustentabilidade no seio de todos os desdobramentos futuros, transformaremos a maneira como vivemos. Temos as soluções inovadoras de que precisamos. Agora temos que adotar políticas que nos permitam a sua implementação.”
A Assembleia começou em luto após a queda do avião da Ethiopian Airlines, que deixou Adis Abeba com destino a Nairóbi em 11 de março, na véspera do encontro no Quênia. O acidente causou a morte de todas as 157 pessoas a bordo, incluindo funcionários da ONU e outros delegados que estavam viajando para o evento. Durante a abertura, os participantes da Assembleia observaram um minuto de silêncio em homenagem às vítimas.
Ao final da Assembleia, delegações adotaram uma série de resoluções não vinculantes que abordam a transição para modelos mais sustentáveis de produção e consumo. Uma das decisões reconhece que uma economia global mais circular — na qual os bens podem ser reutilizados ou reaproveitados e mantidos em circulação pelo maior tempo possível — pode contribuir significativamente para mudar os atuais paradigmas de crescimento.
Outras deliberações apontam que os Estados-membros poderiam transformar suas economias por meio de compras públicas sustentáveis. As resoluções pediram ainda que os países apoiem medidas para lidar com o desperdício de alimentos.
Decisões também abordaram a necessidade de desenvolver e compartilhar as melhores práticas nas áreas de eficiência energética e segurança em cadeias de produção que precisam de refrigeração ao longo de todas as suas etapas.
Outro tema contemplado pelas resoluções foi o uso de incentivos, incluindo políticas financeiras, para promover o consumo sustentável. Os marcos também discutem a eliminação de incentivos que vão no sentido contrário e impulsionam o consumo e a produção insustentáveis.
“Nosso planeta atingiu os seus limites e precisamos agir agora. Estamos muito satisfeitos com o fato de que o mundo tenha respondido, aqui em Nairóbi, com compromissos firmes para construir um futuro em que a sustentabilidade seja o objetivo final em tudo o que fizermos”, afirmou Joyce Msuya, diretora-executiva interina da ONU Meio Ambiente.
“Se os países cumprirem tudo o que foi acordado aqui e implementarem as resoluções acordadas, poderemos dar um grande passo em direção a uma nova ordem mundial, onde não cresceremos mais às custas da natureza, mas veremos as pessoas e o planeta prosperarem juntos.”
Um dos principais focos da Assembleia foi a necessidade de proteger oceanos e ecossistemas frágeis. Os ministros adotaram uma série de resoluções sobre lixo marinho plástico e microplásticos. Decisões incluíram o compromisso de estabelecer uma plataforma multissetorial dentro da ONU Meio Ambiente para tomar medidas imediatas pela eliminação a longo prazo do lixo e dos microplásticos.
Outra resolução chama os Estados-Membros e atores relevantes a combater o lixo marinho por meio da análise do ciclo de vida completo dos produtos e também por meio do aumento da eficiência dos recursos.
Durante a cúpula, Antígua e Barbuda, Paraguai e Trinidade e Tobago aderiram à campanha Mares Limpos da ONU Meio Ambiente, elevando para 60 o número de países integrantes da maior aliança mundial contra a poluição marinha por plásticos. A iniciativa reúne 20 nações da América Latina e do Caribe.
A necessidade de agir rapidamente para enfrentar os desafios ambientais foi ressaltada pela publicação de uma série de relatórios durante a Assembleia.
Uma das pesquisas revela que, mesmo se o mundo cortasse as emissões de gases do efeito estufa conforme o previsto pelo Acordo de Paris, as temperaturas do inverno no Ártico subiriam de 3 a 5 °C até 2050 e de 5 a 9 °C até 2080. O aquecimento devastaria a região e desencadearia o aumento do nível do mar em todo o mundo.
O relatório Ligações Globais – Um olhar gráfico sobre a mudança do Ártico alerta que o rápido derretimento do permafrost poderia acelerar ainda mais as mudanças climáticas. O fenômeno poderia inviabilizar os esforços para cumprir o objetivo de longo prazo do Acordo de Paris — limitar o aumento da temperatura global a 2 °C até o final do século.
O sexto Panorama Global Ambiental, visto como a avaliação mais abrangente e rigorosa do estado do planeta, alertou que milhões de pessoas poderão morrer prematuramente devido a poluição da água e do ar até 2050, a menos que medidas urgentes sejam tomadas.
Produzido por 250 cientistas e especialistas de mais de 70 países, o relatório mostra que o mundo tem a ciência, a tecnologia e as finanças necessárias para avançar num caminho de desenvolvimento mais sustentável. Mas políticos, empresários e o público devem apoiar e incentivar essa mudança.
A vice-secretária-geral da ONU, Amina Mohammed, que participou da cúpula na quinta-feira, disse que um posicionamento contra o uso insustentável de recursos não é mais uma escolha, mas uma necessidade.
“Como os Estados-membros afirmaram durante debates vibrantes, ao lado da sociedade civil, empresas, comunidade científica e outras partes interessadas, ainda é possível aumentar o nosso bem-estar e, ao mesmo tempo, manter o crescimento econômico por meio de uma mistura inteligente de mitigação do clima, eficiência nos recursos e políticas de proteção da biodiversidade”, disse a dirigente.
Enquanto delegações se preparavam para deixar Nairóbi na sexta-feira, centenas de milhares de estudantes de cerca de cem países tomaram as ruas das cidades onde vivem como parte de um protesto global por mais ações contra as mudanças climáticas. O movimento foi inspirado pela mobilização da estudante sueca Greta Thunberg, que liderou uma greve estudantil no ano passado para alertar sobre o tema.
Durante discurso na Assembleia, também na quinta-feira, o presidente da França Emmanuel Macron disse que os jovens estavam certos em protestar e que o mundo precisa dessa fúria para impulsionar uma ação mais rápida e mais intensa contra o aquecimento global.
“Acreditamos que o que precisamos, dada a situação em que vivemos, são leis reais, regras que sejam vinculantes e adotadas internacionalmente. Nossa biosfera enfrenta a devastação total. A própria humanidade está ameaçada. Não podemos simplesmente responder com alguns princípios que soem bem, sem qualquer impacto real”, afirmou Macron.
Também presente, o presidente do Quênia, Uhuru Kenyatta, defendeu que o mundo precisava agir imediatamente para enfrentar os níveis recordes de degradação ambiental, insegurança alimentar, pobreza e desemprego.
“As estatísticas globais atuais são bastante preocupantes e as projeções para as gerações futuras são terríveis e exigem ações urgentes de governos, comunidades, empresas e indivíduos”, enfatizou.
Acesse as resoluções adotadas na Quarta Assembleia Ambiental da ONU clicando aqui.
Foto: ONU Meio Ambiente/Natalia Mroz
Fonte: ONUBR